domingo, 16 de setembro de 2007

Direitos... sem serem questionados


Sabiam que todos os cidadãos, pelo menos os Portugueses têm o direito de recusar ajuda médica? Além de que todos termos direito a uma segunda opinião...
Começando pelo princípio... todos os exames efectuados ao doente pertencem-lhe e têm o direito de ser informados, pelo médico assistente, claro está, sobre os resultados nele constantes... não, não são os familiares.. mas o doente! É preciso que este não esteja em condições de o saber! Quando há consciência pela parte de quem requisita os exames, acho até que os familiares pouco ajudam nesta situação, devem cingir-se ao tal apoio moral!!!
Os doentes têm também o direito, e no meu pensamento, o dever de pedir uma segunda opinião...devem-no fazer, até para poderem descartar algum mau diagnóstico, que vai abundando por aí...
Caso assim o decidam, eles não são obrigados a prolongar a vida por métodos, medicamentosos, cirúrgicos ou clínicos e aqui é que normalmente os familiares costumam fazer errados juízos de valor: o meu familiar está doido, deprimido,etc. por recusar tratamento!
Entendamo-nos, não é por ser uma poupança para o SNSaúde, ninguém pode ser obrigado a tratar-se! Pode não ser nenhuma patologia psiquiátrica o recusar tratamento. No meu entender, excluindo loucura, duas coisas podem ser a causa:
1ª O doente conhecer aquilo que vai passar e não o querer... Normalmente são doentes que conhecem os meios de tratamento, ou por já terem passado por eles ou alguém próximo ou até pelo trabalho que têm ou tiveram... Estão a par das estatísticas e das consequências, mais ou menos dolorosas do processo e recusam-no!
2ª Por acharem que a natureza tem razão e deve seguir o seu curso... para quê alterar o curso natural das coisas? Nos outros animais, normalmente o filho rejeitado tem malformações... Para quê alterar aquilo que a natureza insiste em fazer ou dizer?
Pode ainda ser uma combinação das duas!!!
Em todos os casos, é uma decisão que deve ser muito pensada e reflectida... Não é suicídio, nem deve ser confundido como tal! Deve ser respeitado por todos os cidadãos e não se deve fazer juízos de valor ou tentativa de os descredibilizar!
Porque é que sempre que um indivíduo tem alguma doença deve ir a correr tratar-se, muitas vezes tapando os pés e descobrindo a cabeça, sem grandes esperanças de cura e sobretudo com um sofrimento inerente que não lhe trás qualidade de vida? Se algum indivíduo é por demais independente para quê depender daqueles que muitas vezes lhe escondem o real estado das coisas, ou então inventam argumentos para não os assumir?
Não minto se disser que aqui em Portugal o normal é os familiares ficarem com peninha e andarem a esconder a real gravidade das coisas... esquecem-se que os doentes não são acéfalos e lêem nos olhares mais ou menos compungidos a mentira!
Todos temos o direito à vida... e todos podemos dizer NÃO! Não é muito habitual, mas é um direito! E como tal deve ser respeitado!

sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Solidão...

"Solidão não é a falta de gente para conversar,
namorar, passear ou fazer sexo...
Isto é carência!
Solidão não é o sentimento que experimentamos pela ausência
de entes queridos que não podem mais voltar...
Isto é saudade!
Solidão não é o retiro voluntário que a gente se impõe,
às vezes para realinhar os pensamentos...
Isto é equilíbrio!
Solidão não é o claustro involuntário que o destino
nos impõe compulsoriamente...
Isto é um princípio da natureza!
Solidão não é o vazio de gente ao nosso lado...
Isto é circunstância!
Solidão é muito mais do que isto...
Solidão é quando nos perdemos de nós mesmos
e procuramos em vão pela nossa alma."

Fátima Irene Pinto


(para quem ande à procura de definições...)
Beijo

domingo, 19 de agosto de 2007

Felicidade - Pensamento anónimo...

"Se não encontras a tua metade da laranja, não desanimes, procura a metade do limão, põe-lhe açúcar, aguardente e gelo e sê feliz..."

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

AMIGO

Mal nos conhecemos
Inaugurámos a palavra amigo!

"Amigo" é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!

"Amigo" (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
"Amigo" é o contrário de inimigo!
"Amigo" é o erro corrigido
Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada, praticada!

"Amigo" é a solidão derrotada!
"Amigo" é uma grande tarefa,
É um trabalho sem fim,
Um espaço sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
"Amigo" vai ser, é já uma grande festa!

Alexandre O'Neill, No Reino da Dinamarca

Bondade / Maldade humana


Sempre acreditei que o Mundo se dividia em boas e más pessoas, mas confesso que nunca tinha encontrado as más... Até que um dia descobri que realmente há pessoas cujo maior interesse é falar da vida alheia e que só ficam felizes com a desgraça dos outros!!! Que passam a vida a fazerem-se de coitadinhos, como se Deus perdesse algum do seu precioso tempo só para as tornar infelizes!!!
Esta foi uma das mais importantes aprendizagens... nunca mais o meu Mundo foi igual! Quando conheci esse ser verifiquei que a sua sede de protagonismo e maledicência eram superiores à educação que supostamente os pais lhe deram... Verifiquei também que eu não era um alvo-chave, mas tudo o que rodeia esse ser e que é mais feliz do que ele era alvo dos seus comentários e chacotas... A ela só posso dizer três coisas:
1º Get a life...
2º Olha mais para o teu umbigo e corrige a tua vida em vez de olhares para a vida dos outros...
3º Serei sempre muito mais feliz do que tu, pois sei o que realmente importa!!! E tenho-o!!!

E nunca mais vou pensar nela!!!

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Gosto de...

E há destas coisas... Recebi um convite do Cajó um pouco estranho confesso, mas que me fez ver que realmente é mais fácil dizer o que se não gosta do que o contrário!!! Mas adiante...
Assim sendo, aqui vai:

Gosto de ser feliz...

Gosto da minha família, das graçolas e do sentido de oposição do meu irmão, do carinho, preocupação e da andorice da minha irmã, do sorriso cheio de ternura do meu pai e das esfregadelas da minha mãe, da atenção da minha tia, das criancices da minha avó e da alegria, carinho e ensinamentos dos meus sobrinhos...

Gosto de lambidelas de cão, arranhadelas e ronronar de gato, gosto do esvoaçar e do piar dos pássaros e de todos os animais em geral!

Gosto de fotografia pela sua capacidade de me fazer escapar do dia a dia (e de gastar dinheiro de vez em quando)!

Gosto da minha casa nova, não por se minha mas por me permitir ter o meu lugar no Mundo...

Gosto dos meus amigos... Sobretudo os que me restam e que são muitos e bons!!!

Gosto do meu passado e gosto do meu futuro, seja ele qual for!!!

Gosto de livros, de folhear, de cheirar e devorar alguns autores de que gosto!

Gosto que me achem mau feitio, para com esse receio não me magoarem...

Gosto de poder correr, passear como se o Mundo não tivesse donos e o tempo não tivesse freios...

Gosto de comer pão com manteiga ou de fazer molhinhas no prato!!!

Gosto de ver crianças felizes, velhinhos contentes e amparados e animais bem cuidados!!!

Gosto de ter certeza de qua amanhã ainda há muito mais para gostar!!!

Passo agora o desafio ao Viriato e à Rita para que possam também dizer de sua justiça!!!

Beijinhos a todos e gostem muito de gostar!!!

domingo, 29 de julho de 2007

Solidão...

A maior solidão é a do ser que não ama. A maior solidão é a dor do ser que se ausenta, que se defende, que se fecha, que se recusa a participar da vida humana.

A maior solidão é a do homem encerrado em si mesmo, no absoluto de si mesmo,
o que não dá a quem pede o que ele pode dar de amor, de amizade, de socorro.

O maior solitário é o que tem medo de amar, o que tem medo de ferir e ferir-se,
o ser casto da mulher, do amigo, do povo, do mundo. Esse queima como uma lâmpada triste, cujo reflexo entristece também tudo em torno. Ele é a angústia do mundo que o reflete. Ele é o que se recusa às verdadeiras fontes de emoção, as que são o patrimônio de todos, e, encerrado em seu duro privilégio, semeia pedras do alto de sua fria e desolada torre.

Vinicius de Morais

terça-feira, 10 de julho de 2007

A carta no caminho

Adeus, mas estarás
comigo, irás dentro
duma gota de sangue circulando em minhas veias
ou fora, beijo que me escalda o rosto
ou cinto de fogo na minha cintura.
Minha doçura, recebe
o grande amor que irrompeu da minha vida
e em ti não encontrava território
como o explorador perdido
nas ilhas do pão e do mel.
Encontrei-te depois
da tempestade,
a chuva lavou os ares
e na água
teus doces pés brilharam como peixes.

Adorada, parto para os meus combates.

Escavarei a terra, abrirei uma cova
e nela o teu Capitão
irá esperar-te com flores na cama.
Não penses mais, minha doçura,
no tormento
que pelo meio de nós passou
como um raio de fósforo
e nos queimou talvez.
A paz chegou também porque volto
à minha terra para lutar,
e como tenho o coração completo
com a parte de sangue que me deste
para sempre,
e como
levo
as mãos cheias do teu ser desnudo,
fita-me,
fita-me,
fita-me no mar, que vou radiante,
fita-me na noite que navego,
e mar e noite são os teus olhos.
Nunca te deixo, quando me afasto.
Vou dizer-te agora:
a minha terra há-de ser tua,
vou conquistá-la,
não apenas para ta dar,
mas para a dar a todos,
a todo o meu povo.
Um dia o ladrão deixará a sua torre
e o invasor será expulso.
Nas minhas mãos, até agora
acostumadas à pólvora, crescerão
todos os frutos da vida.
E saberei acariciar as novas flores
porque tu me ensinaste a ternura.
Minha doçura, adorada,
virás comigo à luta corpo a corpo
porque em meu coração vivem teus beijos
como bandeiras vermelhas
e, se cair, não só
a terra me cobrirá
mas este grande amor que me trouxeste
e viveu circulando no meu sangue.
Virás comigo,
espero-te nessa hora,
nessa e em todas as horas,
em todas as horas te espero.
E quando a tristeza que detesto
bater à tua porta,
diz-lhe que eu te espero,
e quando a solidão quiser que troques
o anel onde o meu nome está escrito,
diz à solidão que se entenda comigo,
que eu tive que partir
porque sou um soldado
e que onde quer que eu esteja,
sob a chuva ou sob
o fogo, meu amor,
estarei à tua espera.
À tua espera no deserto mais duro
e junto ao limoeiro florido,
onde a primavera nascer, meu amor,
estarei à tua espera.
Quando te disserem: "Esse homem
não te quer", lembra-te
de que os meus pés estão sozinhos nessa noite e procuram
os doces e pequenos pés que adoro.
Quando te disserem, meu amor,
que te esqueci, e mesmo quando
for eu a dizer-to,
quando eu to disser,
não acredites.
Quem e como poderiam
arrancar-te do meu peito
e quem recolheria
o meu sangue
quando de ti me aproximasse a sangrar?
Mas também não posso
esquecer o meu povo.
Vou lutar em cada rua,
atrás de cada pedra.
O teu amor também me ajuda:
é uma flor fechada
que sempre me inunda com o seu aroma
e se abre de repente
dentro de mim como uma grande estrela.

Meu amor, é de noite.

A água escura, o mundo
adormecido cercam-me.
Daqui a pouco romperá a aurora
e escrevo-te, entretanto,
para te dizer: "Amo-te".
Para te dizer "Amo-te", protege,
mantém limpo, levanta,
defende
o nosso amor, minha alma.
Deixo-te como se deixasse
um punhado de terra semeado.
Do nosso amor nascerão outras vidas.
Em nosso amor outros matarão a sede.
Virá talvez um dia
em que um homem
e uma mulher, iguais
a nós,
tocarão este amor, que ainda terá força
para queimar as mãos que o toquem.
Quem fomos? Que importa?
Tocarão este fogo
e o fogo, minha doçura, dirá teu simples nome
e o meu, o nome
que apenas tu soubeste porque apenas
tu, sobre a terra, sabes
quem sou, e porque ninguém me conheceu como uma,
como uma só das tuas mãos,
porque ninguém
soube como, nem quando
meu coração esteve ardendo:
somente
teus grandes olhos pardos o souberam,
a tua boca larga,
a tua pele, os teus peitos,
o teu ventre, as tuas entranhas
e a tua alma, que eu despertei
para que ficasse
a cantar até ao fim da vida.

Meu amor, espero-te.

Adeus, meu amor, espero-te.

Meu amor, meu amor, espero-te.

E assim termina esta carta
sem nenhuma tristeza.

Os meus pés estão firmes sobre a terra,
a minha mão escreve esta carta no caminho,
e no meio da vida estarei
sempre
ao lado do amigo, em frente ao inimigo,
com teu nome na boca
e um beijo que jamais
se separou da tua.

Pablo Neruda

domingo, 8 de julho de 2007

Há coisas fantásticas, não há?

Ontem, dia 07-07-07 tive o prazer de conviver com uma família muito bonita... Não falo só da sua fisionomia, que era lindíssima, mas do seu coração! Recebeu-me com o à-vontade das pessoas puras de coração e a boa vontade dos generosos!
Confesso que depois de alguma más experiências andava arredada do convívio, limitando-o somente aqueles que me são sobejamene conhecidos...
Mas nesta tarde, senti renascer em mim a esperança no ser humano e na sua capacidade de amar e fazer sentir amado, sem pedir nada em troca além da amizade pura e simples dos homens bons!!!
Bem hajam!!! E obrigado por tudo, até breve!

sábado, 30 de junho de 2007

My Favourite Things (II)

Radicals and SN2 substitutions,
Kc expressions and buffer solutions,
Haworth projections of pyranose rings -
These are a few of my favourite things!

Manganate (VII) that looks like Ribena,
Models of membranes made out of pipe-cleaners,
Programmes on CHIME about haemoglobin -
These are a few of my favourite things!

Weird fruity smells from esterification,
Reflux condensers and redox titrations,
Dichromate (VI) when it’s oxidising -
These are a few of my favourite things!

Standard electrodes, cell statements, salt bridges,
Benzene in petrol, CFCs in fridges,
NMR spectra and nuclear spin -
These are a few of my favourite things!

Born-Haber cycles and mole calculations,
Rate laws and stoichiometric equations,
Maxwell and Boltzmann and Hess and Pauling -
These are a few of my favourite things!

Transfers of protons in acids and bases,
Eluants, solvent fronts, stationary phases,
Lock-and-key models and chymotrypsin -
These are a few of my favourite things!

Beta-D-glucose and glycine and valine,
Loud orange azo dyes and phenolphthalein,
Complexes with transition metals in -
These are a few of my favourite things!

Bright-coloured flame tests of alkali metals,
Aldehydes, ketones and hemiacetals,
Enzyme cofactors and B vitamins -
These are a few of my favourite things!

Teflon and Terylene and polystyrene,
DNA helices, guanine and thymine,
Islets of Langerhans and insulin -
These are a few of my favourite things!

Ether and NaBH4 reductions,
Van der Waal’s forces and semi-conduction,
Bending vibrations when bonds stretch like springs -
These are a few of my favourite things!

Stereochemical isomerism,
Kinetics, catalysts, and mechanisms,
Metal hydroxides precipitating -
These are a few of my favourite things!!

My Favourite Things (I)

Raindrops on roses and whiskers on kittens
Bright copper kettles and warm woollen mittens
Brown paper packages tied up with string,
These are a few of my favorite things.

Cream coloured ponies and crisp apple strudel,
Door bells and sleigh bells and schnitzel with noodles
Wild geese that fly with the moon on their wings,
These are a few of my favorite things.

Girls in white dresses and blue satin sashes,
Snow-flakes that stay on my nose and eye-lashes,
Silver white win-ters that melt into spring,
These are a few of my favorite things,

When the dog bites,
When the bee stings,
When I'm feeling sad,
I simply remember my favorite things,
And then I don't feel, so bad.

sábado, 9 de junho de 2007

"Jamais se desespere em meio as sombrias aflições de sua vida, pois das nuvens mais negras cai água límpida e fecunda." - Provérbio Chinês

"Um forte egoísmo é uma protecção contra a enfermidade mas, no limite, precisamos de começar a amar a fim de evitar a doença, e podemos adoecer se, em consequência de uma frustração, não conseguirmos amar" Sigmund Freud

quinta-feira, 31 de maio de 2007

Este é o poema do amor

Este é o poema do amor.
O poema que o poeta propositadamente escreveu
só para falar de amor,
de amor,
de amor,
de amor,
para repetir muitas vezes amor,
amor,
amor,
amor.
Para que um dia, quando o Cérebro Electrónico
contar as palavras que o poeta escreveu,
tantos que,
tantos se,
tantos lhe,
tantos tu,
tantos ela,
tantos eu,
conclua que a palavra que o poeta mais vezes escreveu
foi amor,
amor,
amor.
Este é o poema do amor.

António Gedeão

quinta-feira, 24 de maio de 2007

Soletrar o Dia


«Tenho tudo por dizer e gasto palavras
para lá chegar. Não sei se me afasto
ou se chego perto. Se alguma vez rocei
a pele do essencial. E pergunto-me sempre
para quê estas palavras que me teimam.
O passado não é o que está feito,
mas o que palavra alguma fará de novo.
Por isso leio sempre no futuro, mas não sei
para que lado do tempo escrevo. E se soubesse
que arrasto as letras como um caranguejo
diria que só tenho esta mão de palavras.
Soletro os dias em que cada coisa que me olha
quando me sinto a vê-la. É tudo.
E não há desculpas para o que faço.»

Rosa Alice Branco

terça-feira, 22 de maio de 2007

Para ser grande

Para ser grande, sê inteiro:
nada teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa.
Põe quanto és no mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda brilha,
porque alta vive.

Ricardo Reis

segunda-feira, 21 de maio de 2007

Ilusão Silenciosa

Por detrás de cada fotografia está uma respiração sibilante, irmã do vento e da memória.

No acto de fotografar todas as emoções podem surgir do seu esconderijo, desviando o corpo para aquilo que não está ali presente. Posso estar a ser embalado numa sensação passiva de beleza narcótica e sou levado a representar uma realidade desinteressante. Isto acontece porque me esqueci de pôr a minha ilusão a agir sobre o assunto que enquadrava.
É o corpo que fotografa. O corpo não está fechado para si mesmo, ele vê e sente a fragilidade do efémero. Também ele está lançado nesse turbilhão chamado tempo. Tenho de estar presente de corpo inteiro. O olhar, a cabeça e o coração no mesmo diálogo, nas mesmas decisões.

Há sensibilidades que estão longe da eficácia. A sua honestidade, a incapacidade de dissimular, a tendência cristalina para agir segundo os seus próprios valores, desvelam um caminho repleto de pedras, abismos, hesitações. Quantas quedas entre o sonho e o que a realidade pede. No entanto, sem sonho pouco fica que valha a pena. E sem o cuidado, a atenção que o mundo pede, que os outros pedem, o que seríamos nós?

Uma fotografia pode tirar-nos as palavras, fechar-nos literalmente a boca com o amor, a violência, o brilho do mar nas pestanas. Mas esses reflexos do tempo, mesmo aqueles que achemos pouco interessantes, não deixam de lançar perguntas ao olhar do interlocutor. Nem que seja:
- O que é? Quem foi? Onde será?
E assim, o universo deve ter mais perguntas do que pontos de luz a denunciar uma pulsação.

O silêncio é essa presença feita ausência, ou algo ausente que volta a nós, é o misterioso acontecimento por detrás de um olhar.
Nesta dicotomia amorosa a fotografia é íntima do silêncio.
Qual seria a intensidade do desejo se tudo fosse pronunciado? Tudo revelado?

O silêncio conotado como algo negativo configura, sobretudo na cultura ocidental, uma fuga para a frente. Esse embaraço de suportar a densidade do outro expõe a falta de recolhimento em relação a nós próprios. Se as visões não nos abandonam mesmo quando temos os nossos olhos fechados, se uma imagem pode valer mais do que palavras, o silêncio também pode falar mais alto do que aquilo que pensamos.
A fotografia mimética, reprodutiva, assemelha-se a determinadas frases que devido ao seu uso utilitário vão perdendo a sua intensidade metafórica. A profusão de imagens nos mais diversos suportes, nos mais diversos locais, banaliza o olhar e satura a visão, porque essa torrente imagética está ao serviço de um conceito utilitário que quer impor-se como espelho do mundo.

A imagem sublima o real. Vivemos grande parte do nosso tempo sob o jugo desta visão perfeita do mundo. A concepção desta realidade relata continuamente aquilo que passa à frente dos nossos olhos, como se uma fantasia tornasse todos os dias iguais a si próprios. Num mundo onde a ficção já não tem espaço para sonhar a vida, a imagem já não pode imaginar o real, porque ela se metamorfoseou naquilo que deveria ser o seu elemento dialético - o próprio real.

A vida próxima, actual e táctil acorda-nos desse sonho vivido num ecrã, numa imagem. Momento esse que abre no tempo e no espaço a vontade de ver o ainda não visto, de trazer ao visível o que em silêncio se desenrola na nossa consciência.

Para além da fotografia ter a tendência para objectivar rastos do passado, ela possui também a capacidade de desafiar o presente e o futuro. Imaginar como seria, o que poderá vir a ser a invenção daquilo que olhamos - colocando em jogo o erro, o imprevisto, o inacabado, uma gramática cheia de tensões, paradoxos, pausas e movimentos. Dar imaginação a um assunto não é acrescentar um silencioso enigma ao mundo?

in «cais» nº100, Julho/Agosto 2005
Ricardo Bento

António gedeão - Memória sobre os teus olhos

Magníficos.
como os jactos que aguardam no aeroporto o iminente sinal da partida,
seus grandes olhos imensos escorvam, impacientes,
o subsolo da imagem pressentida.
Perfurantes como as brocas dos mineiros,
pontas de aço-vanádio
que o cubro alcançam sem perder o gume,
um fogo o olhar o queima, um mar invade-o,
um lume feito de água, água de lume.
Súbito, seus grandes olhos imensos descolam e levantam voa.
Ei-los que sobem.
Seu movimento é como se apenas as coisas deles se afastassem,
é como se move o tempo, sem agravo nem estrago,
como boiam as folhas na dormência do lago,
como bate o coração do homem enterrado no chão.
Na estática subida a que se entregam
são o próprio silêncio em que navegam,
são a curva do espaço,
a quarta dimensão.
Cá em baixo,
onde as superfícies se avaliam
multiplicando pi por érre dois,
um formigueiro de bois
desenha na planície coloridos talhões.
Cumprem-se as sementeiras.
As cores são as bandeiras;
os regos, os limites das nações.
Um rabiar de células,
Cultura de bactérias num capacete de aço,
ziguezagueiam, obstinadas como libélulas,
num charco de sargaço.
Entretanto,
seus grandes olhos imensos olham, e olhando,
no desígnio frontal que não hesita nem disfarça,
com linhas de olhos vão bordando a talagarça.
Sento-me à secretária,
preparo-a, limpo-a, esfrego-a
na aflita busca do mais puro espaço,
e com o esquadro e a régua,
o lápis e o compasso,
construo os olhos d'Ela.
Deliberada e escrupulosamente
ergue-se a construção de arquitectura mansa,
quase cinicamente,
como quem premedita uma vingança.
(Aliás
o engano, a ilusão,
a mentira, a falsidade,
o perjúrio, a invenção,
tudo, em Amor, é verdade.)
Eis os mais lindos olhos deste mundo.
O Amor os fez.
Proas de galeões de velas pandas,
meninas a correr que chegam às varandas
olhando o mundo pela primeira vez.
Dou-lhes uns toques nas íris, um tempero
na plácida inocência,
um miligrama de cianeto, morte sem desespero,
acicate da humana permanência.
Sobre o fundo sombrio um tom de folha seca
de plátano, uns veios
de clorofila,
mancha irisada
em redor da pupila,
óleo vertido no asfalto da estrada.
Encosto o rosto às mãos, e embevecido
contemplo a construção de linhas,
e finjo-me esquecido
como se não soubesse que são minhas.
Como se não soubesse
comovo-me e entrego-me no sorriso total,
Construo o meu real
conforme me apetece.



António Gedeão
Obra Poética
Edições João Sá da Costa
2001

A todos os meus amores: pais,manos, tios, avós e sobrinhos

domingo, 20 de maio de 2007

António Gedeão - Poema da flor proibida


Por detrás de cada flor
há um homem de chapéu de coco e sobrolho carregado.
Podia estar à frente ou estar ao lado,
mas não, está colocado
exactamente por detrás da flor.
Também não está escondido nem dissimulado,
está dignamente especado
por detrás da flor.
Abro as narinas para respirar
o perfume da flor,
não de repente
(é claro) mas devagar,
a pouco e pouco,
com os olhos postos no chapéu de coco.
Ele ama-me. Defende-me com os seus carinhos,
protege-me com o seu amor.
Ele sabe que a flor pode ter espinhos,
ou tem mesmo,
ou já teve,
ou pode vir a ter,
e fica triste se me vê sofrer.
Transmito um pensamento à flor
sem mover a cabeça e sem olhar.
De repente,
como um cão cínico arreganho o dente
e engulo-a sem mastigar.

Cão que levou mordida de cobra tem medo de salsicha (Br)


Sim é verdade, já diz o povo gato escaldado... e eu bem escaldada ando!!!Resta-me aprender com as adversidades e ser MUITO FELIZ!!!

Mais um...

Dia um de um novo blogue..